A Vida como Ela É - Contos de Nelson Rodrigues

Teatro
A Vida como Ela É - Contos de Nelson Rodrigues
11 A 21 janeiro no Teatro Taborda

teatro da garagem

O espectáculo A Vida como Ela É, aqui retomado num conjunto alargado de cinco histórias e num elenco de três actrizes, Ana Palma, Inês Lago e Teresa Vaz, aprofunda a obsessão de Nelson Rodrigues por triangulações pícaras, eivadas de um erotismo mórbido, que acentua o carácter de exposição do desejo.
O desejo assim exposto verbaliza uma noção de mulher cujos contornos têm algo de similar ao culto das magas, em voga no séc. XVII toscano. A Armida, na pintura de Cecco Bravo, emerge sensual e poderosa, a um tempo volúpia e vingança, desejo e morte, na sua sede inconsolável por ter sido abandonada por Ruggiero, na obra Jerusalém Libertada de Torcato Tasso. Também as mulheres em Nelson Rodrigues acrescentam à volúpia e à vingança, uma aura sobrenatural, povoada de monstruosidades ameaçadoras, figuras fantasmagóricas profundamente carnais, numa alusão ao poder mágico, à transição demoníaca entre morte e vida. As graças de Nelson Rodrigues não são portanto apenas engraçadas, são sobretudo perigosas, figuras de aniquilação e contágio, figuras de adivinhação e conluio secreto, de desígnio proibido, agentes de vodu e regresso apocalíptico dos mortos, enfim, de preconceito reaccionário, voluntariamente assumido pelo autor.
Se esta forma peculiar de olhar a mulher diz muito mais sobre uma espécie de impotência masculina, de um olhar assustado de menino espreitando debaixo das saias das senhoras, que nunca terá crescido, surpreso e esmagado por tanta origem revelada, também não deixa de ser sintomática uma alegria genuína, um gosto de comédia desempoeirada, um querer brincar e apenas isso.
Nelson Rodrigues, que se auto-revia na figura de um Anjo Pornográfico, talvez quisesse tão só afastar de vez os demónios que lhe povoavam o espírito respaldando-se no corpo feminino, no corpo do desejo, como uma espécie de ópio carnal que lhe aliviava as dores insuportáveis. Sonhar com mulheres não significa apenas sonhos húmidos, mas também um recolhimento definitivo, como na imagem poderosa de Carlos Fuentes, na obra A Laranjeira, do velho milionário que embarca num iate rodeado de mulheres bonitas para nelas morrer em alto mar.
Quisemos sublinhar o brilhantismo teatral da obra contística do autor, partilhá-la à luz de uma tensão erótica, numa forma de expressão próxima do grotesco da máscara. Procurámos encontrar na cena os jogos exactos e subtis capazes de propiciar terreno para cada conto; variações sobre o mesmo tema obsessivamente (re)contado por Nelson Rodrigues, um talento raro na carpintaria dos diálogos, de humor inebriante e verbo generoso.
Um pouco à maneira de outro italiano, Giorgio Morandi, que quase nunca abandonou os mesmos objectos com que pintou as suas natureza mortas, Nelson Rodrigues escreveu, talvez sempre, sobre a mesma mulher, a mesma história de amor proibido.
92ª Criação do Teatro da Garagem.
Versão a apresentar na Extensão em Portugal do FESTLIP – Festival Internacional de Teatro da Língua Portuguesa.

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Ficha técnica e artística:
Encenação: Carlos J. Pessoa
Dramaturgia: Ana Palma
Contos: Nelson Rodrigues
Interpretação: Ana Palma, Inês Lago e Teresa Vaz
Cenografia e Figurinos: Sérgio Loureiro
Música: Daniel Cervantes
Desenho de Luz: Nuno Samora
Direcção de Produção: Maria João Vicente
Produção e Comunicação: Carolina Mano
Assistência de Produção: Mariana Magalhães e Marília Maia e Moura
Fotografia de Cena: Marília Maia e Moura

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Locais, datas, e horários:
Tearto da Taborda
11 e 12 de janeiro, 21h30
60 minutos | M/16

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Mais informações:
96 801 52 51 | 21 885 41 90
geral@teatrodagaragem.com